segunda-feira, 29 de julho de 2013

“Caiu na Redes é… (estupro)”: A naturalização da violência contra as mulheres

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No último dia 24, durante as comemorações de aprovados no segundo vestibular de 2013 para a UnB, estudantes da Engenharia de Redes ergueram um cartaz no qual se lia “Caiu na Redes é… (estupro)“. A atitude vem gerando grande repercussão, desde acalorados debates nas redes sociais e a instauração de um processo de investigação pela Reitoria. Os dois alunos que aparecem na foto segurando o cartaz emitiram notas na qual se mostram “arrependidos” pela atitude de “mau gosto” (suas notas podem ser lidas em http://www.facebook.com/dce.unb) . É preciso tomar partido nesta discussão.


Suas notas representam uma atitude mínima após tamanha ofensa e incitação à violência contra as mulheres. Certamente a escreveram como demonstrativo de “arrependimento”, no mínimo em consequência do devido repudio da comunidade universitária. Não se pode julgar sua sinceridade senão através de suas práticas e estas, portanto, permanecem a prova.  Porém devemos nos perguntar: será que eles  emitiriam as notas caso não houvesse tamanha publicidade de suas posturas? E, ainda, qual será a consciência do ato realizado através do teor destas notas?

Indo além do caso em particular, a primeira compreensão que se deve ter é que tais atitudes de desrespeito e violência contra as mulheres pelo fato de serem/sermos mulheres é disseminada socialmente como se fosse algo normal. Esta naturalização da opressão contra mulheres, consciente ou inconscientemente, fica explícita nos trechos em que os alunos em questão falam, por exemplo  que: “nossa intenção era fazer um trocadilho”, “jamais foi minha intenção fazer apologia à prática de estupro”, “nunca tive a intenção de ofender “, foi um “ato inconsequente e impensado” etc.

Quer dizer, se se considera verdadeiro o declarado, tem-se que a intenção de uma “simples” brincadeira pode carregar toda sua inconsequência. E isto, definitivamente, não pode ser tratado de forma simples. Os alunos, e anteriormente a própria gestão do DCE, declararam ter sido a atitude de “mau gosto” e “infeliz”. É preciso que se diga: estupro não é questão de gosto! É uma ação de profunda violência física e psicológica contra a integridade de uma mulher e gera marcas por toda uma vida. E isto não pode ser sequer comparado com o fato dos rapazes terem seus “nomes e rostos expostos na mídia de maneira devastadora”. É preciso assumir as consequências de seus atos, refletidos ou não. Não fosse o repúdio, talvez sequer tivéssemos lido suas notas de “arrependimento”.

Se os dizeres no cartaz não chegaram as vias de fato, sua (nada) simples apologia é a reprodução da permissividade social e ideológica de violência contra as mulheres. É esse contexto de permissividade ideológica que incentiva a prática e muitas vezes garante impunidade aos opressores. Não se pode admitir, portanto, que e incitação ao estupro seja um “incidente” de menor natureza, pois não é. É a verbalização favorável a um ato de violência e subordinação das mulheres que, desgraçadamente, ocorrem todos os dias. Mas é preciso dizer um basta! Um basta a objetificação das mulheres como propriedades!

Além disso, como se já não fosse “excludente o suficiente” as barreiras para ingresso nas universidades federais – expresso pelo péssimo ensino básico público, falta de investimentos para o ensino superior, a necessidade do trabalho e o próprio vestibular que deixam milhões de fora –, as posturas ultrajantes de incentivo à violência contras mulheres partindo dos próprios acadêmicos apenas reforçam este elitismo. Temos, ao contrário, que lutar pela completa democratização e universalização do ensino superior público, e não reproduzir hostilidades por antecipação para que mulheres deixem de ingressar na universidade ou em determinados cursos por medo de que supostamente seu sexo permitiria violação por outros. Não aceitamos tal suposição!

Por fim, repudiamos veementemente a atitude destes rapazes. E ao invés de apenas defender as devidas sanções institucionais, é preciso trazer o problema para o cotidiano e sua resolução principalmente através dos centros acadêmicos. Debates e reflexões devem ser realizados, desde o instante do ingresso de calouros/calouras, sobre a condição de opressão contra as mulheres em geral e a superexploração sobre as mulheres trabalhadoras – tal como as terceirizadas de nossa universidade, com baixos salários, assédios morais, falta de direitos como creches públicas ou licença maternidade etc. Devemos repudiar a naturalização da opressão em nosso convívio cotidiano, sem nos deixar levar pelas “euforias do momento” e pela ideologia dominante. É, acima de tudo, indispensável a ação de protagonismo das mulheres, junto aos homens, na luta contra as opressões.

A nossa luta é todo dia: contra o racismo, o machismo e a homofobia!

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